Posted by : Centro Espírita Grupo Fraternidade e Luz quarta-feira, 24 de dezembro de 2014



NATAL DE SABINA

Francisca Clotilde
Natal!... A cidade vibra.
Desde muito anoiteceu.
Ouvem-se vozes cantando:

"Hosanas!!... Jesus nasceu!..."
Rodam carros apressados,
Muitos grupos vão a pé...
A alegria, em toda parte,

Traduz esperança e fé.
Enfeites! Guirlandas! Lojas!...
Cores de todo matiz...
Quantas mães falando em Deus!...

Quanta criança feliz!...
Estrelas lembram na Altura
Alampadários em flor,
Descendo em bandos à Terra

Para um festa de amor.
Em meio de tanto brilho,
Quase de rastros no solo,
Sabina passa na rua

Com trapos a tiracolo.
Andrajos cobrem-lhe o corpo;
Na face desconsolada
Traz ainda o pó viscoso

Do leito sobre a calçada.
Abeira-se de uma casa,
Pede pão, diz que tem fome,
Afirma-se fatigada,

Há dois dias que não come...
Um senhor enrraivecido
Ataca de rosto em brasa:
"O hospício fia mais longe,

Afaste-se desta casa..."
Sabina toma outro rumo,
Pede bolo à padaria,
Vem um rapaz e responde

Com manifesta ironia:
"Não vê que está na cachaça?
Não nota que cambaleia?
Saia daqui, saia agora!...
Peça bolo na cadeia"...

A pobrezinha se arranca,
Procura, em travessa ao lado,
Antiga caixa de esgoto
Num recanto abandonado.
Em torno, a cidade brilha,

Toda envolvida de luz!...
Deitada no chão de pedra,
Sabina pensa em Jesus...
Onde nascera Sabina?

Vivia, afinal, com quem?
Era inútil perguntar,
Ninguém sabia, ninguém...
Lavava roupa em fazendas,
Capinava milharais;

Depois, ficara doente...
Ninguém a queria mais.
Tivera um filho, o Antoninho,
Que lhe fora apoio à vida...
Morrera aos oito de idade,

Com febre e tosse comprida.
Desde a morte do menino,
Fazia em tudo supor,
Abatida e desgrenhada,

Que enlouquecera de dor...
Era triste, desleixada,
Andava, de déu em déu,
Se parava, era somente

A fim de fitar o Céu.
Nessa noite de alegria,
Embora sem entendê-las,
Enfraquecida e cansada,
Sabina olhava as estrelas.

Parecia o firmamento
Um campo da primavera...
Onde estaria no alto
O filho que Deus lhe dera?
Em lágrimas, recordava

O Natal de antigamente,
O barraco improvisado,
O bule de café quente...
Revia, a fel de saudade,

Os sorriso de Antoninho,
Ao despejar-lhe nas mãos
As dádivas do vizinho...
Restava
-lhe, unicamente,

Depois do filhinho morto,
Doença, frio, abandono,
Sofrimento, desconforto...
Nisso, alguém lhe surge à frente,
Homem moço em largo manto,
Por tudo e em tudo irradia
Incomparável encanto.
"Sabina
- falou o estranho
-
Em que pensa, triste assim?
Não vê que a cidade interia
É um luminoso jardim?
Ela explica:
- "Não, senhor,
Nada vejo, em derredor,
Quando é noite de Natal,
Meu sofrimento é maior..."
"Que quer você?
- Disse o jovem
-
Dinheiro? Roupas de renda?
Um tanque para lavar,
Um milharal de fazenda?
"Ah! senhor
- clamou a pobre,
Tremendo na ventania
-
Se o Céu me escutasse agora,
Nada disso pediria...
Como sempre, rogo em prece,
Enferma e só como estou,
O filho que Deus me deu
E a morte me arrebatou..."
"Sua oração foi ouvida..."
Ele informa, face em luz.
"Quem ouço?..." indaga Sabina.
Ele diz:
- "Eu sou Jesus!..."
Do manto Dele um pequeno
Sai envolto em doce brilho...
Clama o garoto:
- "Mamãe!..."
Sabina grita:
- "Ah! Meu filho!..."
Encontro, surpresa, bênção,
júbilo imenso depois...
Sabina beijava o filho,
Jesus abraçava os dois!...
Naquelas pedras de rua,

Que a luz do Céu banha e doura
Clarões pintavam em prata
Lembranças da Manjedoura.
Logo após, os três partiam
Ouvindo canções ditosas,

Em nave feita de estrelas
Emolduradas de rosas.
Em toda parte, as legendas
Que o mundo nunca esqueceu:
"Glória a Deus!... Paz sobre a Terra!...
Hosanas!... Jesus nasceu!..."

No outro dia, cedo ainda,
Uma senhora na estrada,
De longe, enxerga Sabina
Como a dormir, recostada...
A dama quase supõe

Na pobre que conhecera
Um retrato da alegria
Numa escultura de cera.
Volta à casa... Traz um caldo,
Quer saber se a reconforta.
Chama Sabina, de leve,
Mas Sabina... estava morta.


Livro Natal de Sabina -
Psicografia Chico Xavier

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